Reflexões sobre a Sexta-Feira da Paixão

15/04/2022 14:13
"Não te deixes vencer pelo mal, mas vence o mal com a prática do bem." (Rm 12.21)
Essa frase do apóstolo Paulo tem profundas implicações para hoje. Significa, dentre tanta coisa, que corremos o risco de, ao lutar contra a perversidade que nos cerca de perto, nos tornar parte dela. Risco de se concretizar o que Nietzsche afirmou séculos mais tarde: “Quem combate monstruosidades deve cuidar para que não se torne um monstro. E, se você olhar longamente para um abismo, o abismo também olha para dentro de você.” Risco de se desumanizar ao combater a desumanização; de responder à violência com mais violência, de devolver ao ódio destrutivo uma postura que odeia. Enfim, risco de se deixar vencer pelo mal.
Nesses momentos, precisamos retornar a Jesus de Nazaré. Sim, sempre a Jesus. Sabe quem é? Esse que os cristãos dizem seguir.
Numa Sexta-Feira da Paixão - como essa de hoje - Jesus foi preso pelo Estado e submetido a tortura, violência e dor. Enfrentou as consequências de se levantar como profeta contra o Império todo-poderoso e as elites religiosas que serviam a este Império. Jesus criticou os fariseus religiosos, os sacerdotes embevecidos por sua própria arrogância, os templos que destruíam a vida por ação ou omissão (qual a diferença, aliás?). Ao viver vida plena em Deus e com os outros, ao viver em liberdade sua própria espiritualidade, ao celebrar a diversidade que a vida propõe, ao aceitar todos e todas (sem NENHUMA exceção!) em sua presença, ao caminhar entre gente sofrida, rejeitada e oprimida pelo peso da Lei e pela moralidade farisaica, Jesus se tornou um incômodo religioso, político, econômico e social às elites de seu tempo.
E as elites responderam. Em nome da moral, dos bons costumes, da religiosidade engessada e da defesa do poder, exigiram em alto e bom som: Crucifiquem o profeta de Nazaré!
Nesta sexta-feira da paixão, Jesus enfrentou toda a força do mal. No auge de seu sofrimento injusto, Jesus respondeu a esse mal com o pedido a Deus: "Pai, perdoa-lhes porque eles não sabem o que fazem." (Lc 23.34). Isso quer dizer que, diante do mal, Jesus rejeitou a resposta do mal. Jesus não respondeu ao mal com vingança, ódio, ou "arminha na mão". Não escolheu o "olho por olho, dente por dente", mas preferiu o caminho do perdão e da vida.
Jesus, o Senhor da vida, não usa da violência ("o último refúgio da incompetência", como diria Isaac Asimov) como resposta para os dramas da vida. Jesus não decide odiar em nome do amor. Não escolher matar para preservar a doutrina "correta" (?) sobre Deus. Jesus não odeia as pessoas por serem diferentes. Jesus não se desumaniza, mesmo diante de toda desumanização que marca o tempo em que vive (e morre).
Hoje, mais uma vez, é sexta-feira da Paixão. Por isso, hoje é dia de pausar a vida e pensar com cuidado sobre nosso procedimento enquanto discípulos e discípulas do Mestre de Nazaré. Hoje é dia de escolher a proposta de Jesus para ser possível vencer o mal com a prática do bem.
Que Jesus nos ajude nessa decisão!
Marcio Simão de Vasconcellos