NATAL: convite para ir à manjedoura
Esta é minha mensagem de Natal para todos vocês.
Natal: convite para ir à manjedoura
"Meu irmão ouviu uma mulher dizer num ônibus, no momento em que passavam por uma igreja com um Presépio: 'Oh, Senhor! Eles põem religião em tudo! Olhe ali, agora estão enfiando religião até no Natal!'" (LEWIS, C. S., Cartas a uma senhora americana, p. 99).
Esta frase do escritor irlandês C. S. Lewis revela uma realidade de nosso tempo: Natal transformou-se em festa do consumo. Com assustadora frequência, os presentes, as luzes e músicas natalinas escondem corações incapazes de relacionamentos interpessoais; gente aprisionada dentro de si mesma, com sorrisos e abraços superficiais e vazios. Em muitas ocasiões, presentes são usados como subterfúgio para evitar encontros interpessoais verdadeiros e reveladores. Os presentes são escudos. As celebrações de Natal viraram construções de fortalezas no interior das quais nos escondemos com medo da vida.
Tratando quase do mesmo tema, Rubem Alves disse: “é certo que as celebrações do Natal são orgias de ricos, celebrações do desperdício e lixo. Celebrações de lixo? Aquelas pilhas de papel de presente colorido, em que vieram embrulhados os presentes, não são essências às celebrações? Rasgados, amassados, embolados num canto. Irão para o lixo. Quantas árvores tiveram de ser cortadas para que aqueles papéis fossem feitos. Para quê? Para nada.”
Essa indiferença é bem disfarçada pelo consumo e pela religiosidade à qual nos acostumamos. O problema é que, num certo sentido, o Natal tornou-se familiar demais em nossa vida. Tornou-se lugar comum. Festa rotineira enxergada com os olhos da religião. Essa noite, por exemplo, quando muitos se reunirem ao redor da ceia, irão se abraçar em família e dizer “Feliz Natal”. Mas às vezes, isso só são palavras. Importantes, sem dúvida, mas palavras indiferentes de quem já se acostumou ao Natal.
Lendo a narrativa do nascimento de Jesus, no evangelho de Mateus, capítulo 2, encontramos uma história que ilustra o risco da familiaridade com o Natal e a convocação evangélica de enxergarmos a festa natalina com olhos de estrangeiro, de pagão.
A narrativa nos fala de “uns magos do Oriente” que vieram a Jerusalém em busca do recém-nascido Rei dos judeus. Aos olhos dos judeus, são pagãos no mais completo sentido da palavra. Como buscavam um rei, imaginaram que o encontrariam nos palácios reais. Por isso vão perguntar ao rei Herodes, em Jerusalém, cidade de reis.
Como todo rei, Herodes não quer concorrência. Convoca os principais sacerdotes e escribas do povo – gente especialista nas coisas da religião! – e pergunta se eles sabem algo a respeito. Os sacerdotes nem precisam pensar muito. Lembram-se logo de uma profecia antiga, proferida por Miquéias, e dizem ao rei: “O Messias nascerá em Belém.”.
Belém, diga-se de passagem, é uma aldeia insignificante, distante em todos os sentidos dos centros de poder político, social, econômico e religioso da época. Belém não é Jerusalém. Belém é “cidade do pão”, das coisas do cotidiano, daquilo que alimenta a vida dos camponeses da Palestina na época deste primeiro Natal. É lá que o Messias nasce.
E é para lá que os magos caminham.
Em direção a uma manjedoura.
E o que isso tem a ver com não ver o Natal com olhos da religião? O que isso tem a ver com encontrar o verdadeiro Natal?
Tem tudo a ver. Pois encontra a manjedoura, e nela o verdadeiro Natal, quem ousa olhar a vida com olhos de estrangeiro, quem sabe de pagão. Porque somente esses são capazes de ver na vida, na criação, nos céus estrelados, a estrela que guia o caminho até Jesus. Somente esses são capazes de enxergar os sinais de Deus de fora de uma religiosidade já pronta, já estática, e, por essa mesma razão, já morta.
Lembre-se de que os principais sacerdotes e escribas sabiam responder ao rei sobre o local de nascimento do Cristo. Sabiam citar textos bíblicos e eram capazes de interpretá-los corretamente para o rei. Mas eram incapazes de caminhar com os magos até Belém. Num paradoxo gritante, os que não tinham Escritura nenhuma debaixo dos olhos foram capazes de ler a vida e os sinais do Natal a fim de encontrar a manjedoura. Enquanto aqueles que tinham as Escrituras nas mãos, fecharam o coração para a revelação absurda do Deus que veio a Belém.
Encontra a manjedoura, e nela o verdadeiro Natal, quem enxerga de fora dessa lógica imersa no mercado, no capitalismo, nas compras e vendas. Pois quando Jesus nasceu, não houve holofotes que o anunciassem ao mundo. Bastou uma estrela.
Quando Jesus nasceu, não houve templos nem palácios que o abrigassem. Bastou uma estrebaria.
Quando Jesus nasceu, não houve luxo ou ostentação, nem decorações luminosas. Bastou uma manjedoura.
Quando Jesus nasceu, não havia árvores montadas, nem luzes brilhantes nas ruas, nem presépios armados.
Quando Jesus nasceu, não havia lojas de departamentos, lotadas com pessoas em busca de presentes. Também não havia cartões de crédito nem Black Friday’s.
Então, o que havia neste primeiro Natal?
Havia uma manjedoura. Havia um casal jovem e inexperiente com a súbita responsabilidade de cuidar do Filho de Deus. Havia um bebê. Havia pastores. E havia pagãos.
E em tudo havia o anúncio da simplicidade do evangelho que tem a todos os homens, mulheres, crianças, velhos e jovens uma mesma mensagem: Glória a Deus no mais alto dos céus e paz na terra aos homens que Ele ama!
Pois o Natal é a lembrança boa de que graça e verdade repousaram naquele bebê na manjedoura. É a quase inacreditável mas verdadeira notícia de que Deus quis tornar-se um de nós. “Deus estava em Cristo”, diz o apóstolo Paulo, “reconciliando consigo mesmo o mundo, não lhes imputando os seus pecados.”
Nesse Natal, em meio às guloseimas e aos presentes, pare por um momento para refletir: o sentido do Natal não está nas coisas que ganhamos (tão, tão frágeis) mas sim nos relacionamentos que mantemos durante nossa caminhada rumo à manjedoura em Belém.
Pois Natal é convite para irmos todos e todas à manjedoura em Belém.
Natal é Jesus Cristo. E isso resume tudo.
Um abençoado Natal para você e sua família!
24 de dezembro de 2014
Marcio Simão de Vasconcellos