NATAL É...

24/12/2016 11:19

"Meu irmão ouviu uma mulher dizer num ônibus, no momento em que passavam por uma igreja com um Presépio: 'Oh, Senhor! Eles põem religião em tudo! Olhe ali, agora estão enfiando religião até no Natal!'" (LEWIS, C. S., Cartas a uma senhora americana, p. 99).

 

Esta frase do escritor irlandês C. S. Lewis revela uma realidade de nosso tempo: Natal transformou-se em festa do consumo. Com assustadora frequência, os presentes, as luzes e músicas natalinas escondem corações incapazes de relacionamentos interpessoais; gente aprisionada dentro de si mesma, com sorrisos e abraços superficiais e vazios. Em muitas ocasiões, presentes são usados como subterfúgio para evitar encontros interpessoais verdadeiros e reveladores. Os presentes são escudos. As celebrações de Natal viraram construções de fortalezas no interior das quais nos escondemos com medo da vida. Nas palavras de Rubem Alves, “é certo que as celebrações do Natal são orgias de ricos, celebrações do desperdício e lixo. Celebrações de lixo? Aquelas pilhas de papel de presente colorido, em que vieram embrulhados os presentes, não são essências às celebrações? Rasgados, amassados, embolados num canto. Irão para o lixo. Quantas árvores tiveram de ser cortadas para que aqueles papéis fossem feitos. Para quê? Para nada.”

Mas o Natal não é isso. É preciso proclamar em alto e bom som! O Natal não é nada disso!

Pois o Natal é Deus concretizando seu desejo de fazer-se um de nós.

Natal é Deus chorando no colo de Maria, ofuscado, de certa maneira pela primeira vez, pelo brilho das estrelas que Ele mesmo fez.

Natal é a alegria paterna e o amor materno, simultaneamente sentidos no olhar da criança embalada em seu sono, na manjedoura, cena tão conhecida dos nossos presépios.

Natal é a presença de pastores e magos – gente desqualificada pelas elites sociais, políticas e religiosas da época – sendo recebida no momento de maior alegria de uma família e acolhida no reino do seu Filho. Natal é saber que a essas pessoas a palavra de Deus é “não tenham medo!”.

Natal é ouvir as boas-novas dos anjos de que o Salvador chegou até nós, compartilhando o desejo celeste que exista paz na terra. Natal é reconhecer que Deus quer bem aos seres humanos. A todos os seres humanos.

Natal é Deus crescendo em estatura, sabedoria e graça, alegrando-se com essa experiência boa de ser humano como nós. Natal é jogar bola, brincar nas ruas de Nazaré, comer com gratidão o pão de cada dia, percebendo que às crianças pertence o reino.

Natal é afirmar com toda ousadia que Deus é Amor tão poderoso que rompeu a segurança do céu e decidiu caminhar conosco, lado a lado, sentindo nossas dores e enfrentando nossas crises. Natal é afirmar a presença do Pai no portão à espera do filho que foi embora. Natal é crer na peregrinação sem pausas que o Bom Pastor faz em busca da ovelha perdida. Natal é se entusiasmar com a alegria da dona de casa quando reencontra a moeda que havia desaparecido.

Natal é Deus que anda por toda parte, sobretudo nas periferias do mundo, fazendo o bem a todos que encontra, proclamando a mensagem do reino que é justiça, paz e alegria. Natal é Deus sentindo a dor da mãe que perdeu seu filho, do leproso expulso da cidade, da hemorrágica impedida de viver plenamente, do chefe da sinagoga com a filha doente, dos famintos, dos pobres, dos enlutados, dos doentes, dos pecadores, dos não-amados, dos negligenciados, dos deprimidos, das crianças refugiadas, dos muitos Aylans que morrem aos milhares nos mares fronteiriços da Europa, dos que se vendem e dos que os compram, de todos os que sofrem no mundo. Natal é Deus agindo em prol dessas pessoas, devolvendo-lhes a dignidade perdida.

Natal é ter amigos em Betânia com os quais se pode passar um tempo bom. Natal é experimentar a morte de gente amada, sentindo a imensa tristeza que, contudo, não ofusca a esperança da ressurreição. Natal é agradecer ao Pai, em oração, pois Ele sempre ouve nossa voz, mesmo nestes momentos.

Natal é Deus desejando fazer-se humano em Jesus, a fim de participar da nossa vida. Natal é Deus encantado com as aves do céu e com os lírios do campo, parábolas vivas do cuidado do Pai. Natal é Deus rindo, exultando de alegria, porque aos pequenos foi revelado o reino dos céus.

Natal é Deus convidando para descansar num lugar à parte da agitação do mundo. Natal é Deus desejoso de partilhar momentos de íntima comunhão conosco, reproduzindo seus passeios com o ser humano na viração do dia, no Éden.

Natal é Jesus, Deus-Emanuel, Deus-Conosco, Deus-misericórdia, Deus-compaixão, Deus-amante-da-vida, Deus-acolhedor, Deus-alegre, Deus-que-quer-dar-vida-plena.

Natal não é apenas mais uma data no calendário. Natal é Cristo que convida a todos e todas a um banquete farto na mesa do Pai. Quem quiser, venha! Beba de graça da água que realmente mata a sede! Coma do pão que verdadeiramente sacia a fome do corpo e da alma! Não se acanhe. Não titubeie. Não tenha medo, pois hoje vos nasceu o Salvador, que é Cristo o Senhor.

 

Um feliz e abençoado Natal!

Petrópolis, 24 de dezembro de 2016, às 11:46h

Marcio Simão de Vasconcellos